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O dilema africano: A persistência da dependência pós-colonial - Alcides Sakala

 Vários países africanos falantes da língua portuguesa, entre os quais Angola, preparam-se para celebrar, em 2025, cinquenta anos de independência. Portanto, meio século de existência, num contexto de muitos desafios e dificuldades políticas, sociais e económicas. No entanto, diga-se, em abono da verdade, que outros países africanos, com a independência conquistada há mais de cinquenta anos, ainda enfrentam problemas multifacetados, no domínio político e económico, no domínio dos sistemas nacionais de governação, na afirmação da democracia, nas infraestruturas, segurança e estabilidade social. Contudo, todos esses países, com muito poucas excepções, têm algo em comum. São ricos em recursos estratégicos, entre os quais sobressai o petróleo, o coltan, o cobre, ouro, diamante, urânio, com solos férteis e água em abundância.

No entanto, a exploração desses recursos continua a beneficiar mais os países estrangeiros e as corporações multinacionais do que as próprias nações e povos africanos. Milhões de africanos continuam mergulhados numa pobreza endémica. São vítimas da corrupção, de conflitos cíclicos internos, da exclusão social e da dependência económica, resultante da exportação de matérias primas estratégicas, cujos produtos finais transformados no exterior são revendidos aos africanos, a preços muito elevados. Por isso, sem domínio dos seus recursos estratégicos e a braços com a instabilidade política, muitos países africanos continuam acorrentados às mordaças da dependência económica. A manutenção desses vínculos de dominação pós colonial, beneficia as elites dirigentes da maior parte dos Estados, e afecta profundamente a vida de milhões de africanos.

Uma das mais claras evidências da continuação dos laços de dominação é o sistema do Franco CFA. Uma moeda utilizada por vários países africanos francófonos e garantida pelo Tesouro francês. Embora esses países sejam teoricamente independentes, a sua política monetária ainda é fortemente influenciada pela França. Essa relação monetária perpetua a dependência económica e limita a autonomia financeira desses países, impedindo um desenvolvimento económico mais independente.

Por outro lado, a exploração do urânio, um recurso crucial para a produção de energia nuclear, é outro exemplo dessa relação de dependência. Países como o Níger possuem vastas reservas de urânio, mas a maior parte da mineração e extração é controlada por empresas estrangeiras. Isso leva a situações onde o urânio é extraído a preços baixos e exportado, enquanto os produtos finais, como energia nuclear, são vendidos a preços muito mais elevados. Acontece igualmente com o coltan, um minério estratégico essencial para a fabricação de eletrônicos, extraído principalmente na República Democrática do Congo. A sua mineração é muitas vezes realizada em condições extremamente precárias, com trabalhadores pagos com salários muito baixos. Além disso, a instabilidade política e os conflitos armados na região leste da RDC, são exacerbados pela luta pelo controle desses recursos minerais.

O mesmo acontece com o ouro, cuja extração em muitos países africanos é dominada por empresas estrangeiras. A maior parte do lucro gerado pela mineração do ouro vai para essas empresas, enquanto as comunidades locais sofrem frequentemente com os impactos ambientais e sociais negativos, decorrentes da mineração. A exploração do petróleo segue o mesmo rumo. Exporta-se petróleo bruto a um determinado preço, mas os derivados do petróleo, transformados no exterior são revendidos nos respectivos países de origem, a preços elevados. Essas dinâmicas perpetuam o ciclo de dependência e de subdesenvolvimento. De facto, os países africanos enfrentam dificuldades em agregar valor aos seus próprios recursos naturais, como também em desenvolver indústrias locais que possam transformar essas matérias-primas em produtos acabados.

Esse ciclo é reforçado por políticas comerciais e financeiras internacionais que favorecem as nações mais desenvolvidas. Pode assim concluir-se que a independência nominal das antigas colônias não cortou os laços de dominação, mas transformou-os em formas mais sofisticadas e, muitas vezes, menos visíveis de controle. A exploração dos recursos naturais e a dependência de estruturas económicas e financeiras, como o sistema do Franco CFA, são exemplos claros de como essas relações de poder continuam a influenciar e limitar o desenvolvimento das nações e populações africanas. O grande desafio para esses países africanos é encontrar formas de romper esse ciclo e alcançar um desenvolvimento verdadeiramente independente e sustentável para a afirmação da independência nacional. Livres são os Estados, povos e nações que decidem o seu próprio destino.

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