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O regresso dos que nunca foram - Chipilica Eduardo

 Sete Deputados eleitos pela lista do partido UNITA para legislatura 2022-2027 suspenderam o exercício das suas funções com o argumento de agirem “ em conformidade com a legislação vigente, que proíbe que um Deputado eleito em uma lista se filie a um partido diferente que o elegeu”.

A turma é composta por Abel Epalanga Chivukuvuku, Xavier Jaime Manuel, Isaias Daniel Sambangala, Américo Kolonha Chivukuvuku, Florêncio Kanjamba, João Quipipa Dias e Carlos Xavier Luís Lucas.

Essa suspensão do mandato levanta uma série de implicações políticas e jurídicas. A primeira, desde já, relacionada com a desestruturação da Frente Patriótica Unida- FPU(UNITA, Bloco Democrático e o então projecto PRA-JA-SERVIR ANGOLA), porquanto este período de pré-eleitoral é crucial para o fortalecimento e criação de estrategias conjuntamente e não de forma solitária.

A prioridade para PRA-JA-SERVIR ANGOLA é a realização do seu congresso e a consequente apresentação do projecto de nação, aliada, também, à definição do modelo de candidatura para as eleições gerais de 2027. Ora bem, é, justamente, neste último ponto em que está o âmago da questão. Ou seja, os indicadores sustentam uma candidatura fora da FPU, se nos ativermos aos pronunciamentos públicos dos seus integrantes o de “ser governo ou fazer parte do governo”.

Ser governo é um «pesadelo» que se vende ao eleitor, pois, em Angola, a fraude é um processo e não se confunde com a votação. Dito de outro modo, a não reforma da legislação eleitoral, a captura das instituições públicas e a falta de liberdade imprensa e de expressão são como que as armas do partido da situação.

Portanto, o Bloco Democrático deve concorrer isoladamente, sob pena de extinção, por não ter participado em duas eleições consecutivamente (não apresentou candidatura nem como partido nem como coligação). Enquanto isso, de resto, se questiona se a UNITA sozinha seria incapaz de vencer as eleições.

Por isso, o mais provável para o PRA-JA-SERVIR é fazer parte do governo com o vencedor fraudulento MPLA. Esta tese é, facilmente, sustentada pelos cenários actuais. Não há vontade política para realização de um processo eleitoral livre, transparente e justo, sobretudo com verdade eleitoral.

Então, partindo desse princípio, os Deputados que suspenderam o mandato regressarão, provavelmente, aos seus assentos na legislatura 2027-2032 pela lista do PRA-JA, criando a narrativa de que trabalharam arduamente para a obtenção dos lugares, porquanto dificilmente os seus nomes não constarão nas posições privilegiadas. Logo, a meu ver, dar-se-á aquilo aquilo a que eu chamaria de "regresso dos que nunca foram".

Entretanto, o primeiro argumento que consta da carta subscrita pelos então Deputados, dirigida à Senhora Presidente da Assembleia Nacional, é o previsto no artigo 151º, nº1 al a) da CRA que preceitua que "o mandato do Deputado deve ser suspenso, nos seguintes casos: a) exercício de cargo público incompatível com a função de Deputado, nos termos da Constituição.

Porém, nenhum dos Deputados exercerá qualquer cargo ou função inconciálivel, pois ocuparão cargo político-partidário(Presidente, Secretário e outros do partido). Logo, o argumento parece muito fraco.

O segundo argumento é versado pelo artº 23º da Lei nº 13/17, de 6 de Julho- Lei Orgânica que aprova o Regimento da Assembleia Nacional segundo o qual "A suspensão, a perda, a substituição de Deputados, bem como a renúncia do mandato efectuam-se nos termos da Constituição e do Estatuto do Deputado".

O terceiro argumento é o do art.4º da Lei nº6/08 de 04 de Julho- Lei Orgânica do Estatuto Remuneratório dos Deputados, que realça, em tese, "havendo interrupção do mandato, por mais de 45 dias, por causas imputáveis ou da responsabilidade do Deputado ou suspensão do mandato para exercício de outras funções ou cargos públicos, sociais, empresariais ou particulares incompatíveis com o mandato, há lugar à suspensão do estatuto, nos termos da presente Lei".

A ideia segundo a qual foi mais vontade dos subscritores do que propriamente imposição legal começa a ter algum sentido, porque esses nunca foram filiados da UNITA. Por outro lado, a suspensão é diferente de renúncia. Esta (última) é regulada pelo art. 152, nº1 e 2 al c) da CRA, nos termos do qual o Deputado pode renunciar ao seu mandato mediante declaração escrita. O Deputado perde o mandato sempre que: filie-se em partido diferente daquele por cuja lista tenha sido eleito.


Então, em rigor, a cessação de filiação esbarra-se na filiação em um outro partido, se olharmos para o que determina o art. 28º da Lei nº 22/10 de 3 de Dezembro- Lei dos Partidos Políticos.

A permanência do Deputado na Assembleia Nacional eleito em lista de partido de que não seja militante e/ou não tenha a filiação primária, com o devido respeito à opinião oposta, não é razão suficiente para a suspensão de mandato, mas, sim, de perda de mandato.

“Mas situação diferente é a de o Deputado, entretanto, se filiar em outro partido político. Neste caso, ele perde o mandato definitivamente”. In Raúl Araújo e Elisa Rangel, em Constituição da República Anotada- Tomo II, p.420. Inexistem dúvidas, o caminho dos sete Deputados é renúncia e consequentemente perda do mandato.


Portanto, existem duas situações diversas: O Deputado eleito pode permanecer como independente, apesar de existir litígio no partido sem ser, no entanto, parte integrante da bancada parlamentar, por um lado; por outro, se ele é militante e, por conseguinte, for eleito como deputado, e filiar-se a um outro partido, perde o mandato.

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