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As consequências do próximo “ajustamento estatutário” do MPLA

 Confirmou-se na quarta-feira em Luanda (9/10) a possibilidade do Presidente João Lourenço continuar a liderar o MPLA depois de em 2027 abandonar a Presidência da República no final do seu segundo e último mandato constitucional.

A informação relacionada com esta perspectiva resultou de uma reunião de algumas horas do Comité Central do MPLA que formalizou a convocatória do 8º Congresso Extraordinário do partido governante que na primeira semana de Dezembro discutirá uma proposta de alteração dos seus estatutos que poderia viabilizar a permanência de João Lourenço à frente do partido.

Oficialmente está-se a falar apenas de uma “proposta de ajustamento dos estatutos”, de acordo com os termos do comunicado final do encontro, citando a necessidade de se adaptar a estrutura partidária às recentes mudanças administrativas do país.

Em concreto, o que não deixa de ser bastante surpreendente, o Comité Central não tomou ainda conhecimento oficial do conteúdo desta alteração estatutária que assim permanece nos bastidores, mas já apenas como um “Segredo de polichinelo”.

A questão que alguns analistas têm vindo a colocar desde que se começou a falar da “bicefalia”, o que já leva algum tempo, está relacionada com a legitimidade ou não de um Congresso extraordinário poder alterar os estatutos da organização.

De acordo com o que rezam os actuais estatutos do MPLA, a alteração deste documento fundamental parece ser uma competência exclusiva dos Congressos ordinários.

O problema é que se os estatutos não forem alterados, dificilmente João Lourenço poderá recandidatar-se a um novo mandato como Presidente do seu partido no próximo Congresso ordinário do MPLA, marcado para 2026, se for essa a sua intenção.

Ora como se sabe e por força dos actuais estatutos, o Presidente do MPLA é por inerência de funções o seu candidato ao cargo de Presidente da República. Não podendo João Lourenço concorrer a mais um mandato para Presidente da República, também não o poderá fazer à liderança do seu partido, por razões óbvias.

É aqui que entra a história da “bicefalia”.

Ao alterar ou ajustar agora os estatutos do MPLA, a ideia seria desbloquear esta relação, permitindo que o Líder do Partido não tenha de ser obrigatoriamente o seu candidato às eleições presidenciais.

Se tudo correr conforme adiantam fontes convergentes, em 2026 João Lourenço poderá assim renovar a sua candidatura à liderança do MPLA, ficando por saber como é que depois serão escolhidos os candidatos do partido à Presidência e Vice-Presidência da República.

Isto, numa altura em que poucos arriscam nomes de putativos candidatos, o que parece ser a atitude mais prudente.

Mantendo-se na liderança do MPLA e independentemente de quem venham a ser os candidatos, num cenário de vitória eleitoral, João Lourenço continuaria a ser o homem forte do país. Pela via da Assembleia e da bancada parlamentar do MPLA, que está definida nos estatutos do MPLA como sendo um órgão partidário hierarquicamente dependente, o Presidente do Partido manteria assim o controlo do Executivo. Com isto, esvaziar-se-ia o poder do futuro Presidente da República para liderar o executivo.

Agora só falta mesmo saber quais serão os contornos exactos deste “ajustamento estatutário” que o próximo Congresso Extraordinário irá discutir e muito provavelmente aprovar.

No discurso que proferiu na abertura desta reunião do Comité Central, João Lourenço não poupou críticas indirectas a todos quantos no seio do MPLA se têm estado a manifestar contra a sua gestão política.

“Não se vislumbram eleições gerais no país para breve, por não ser o tempo estabelecido pela Constituição, igualmente não se vislumbram eleições no Partido, por não ter chegado o momento estabelecido pelos nossos Estatutos”.

Com estas palavras renovou a sua crítica a algumas figuras de proa do MPLA que já fizeram história no tempo de José Eduardo dos Santos e que agora entendem que João Lourenço não devia mais usar qualquer outro processo ou expediente para prolongar o seu protagonismo após 2027, findos os seus dez anos na Presidência da República e quase outros tantos na liderança do partido.

A política, destacou, “é um jogo e como em qualquer jogo ou competição só vencem as equipas cujos jogadores ou atletas se submetem à organização e disciplina do colectivo e respeitam as regras do jogo e a orientação da equipa técnica”.

A sua mensagem dirigida claramente aos seus adversários internos foi mais longe, quando afirmou diante dos mais de 400 membros do Comité Central presentes na sala que “ninguém começa o jogo sem ouvir o apito do árbitro, ninguém inicia a corrida de atletismo sem ouvir o tiro de partida, sob pena de ser desqualificado e prejudicar a equipa”.

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