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Quando a Política de Escritório se Torna Mortal - Sousa Jamba

 O recente e chocante assassinato do diretor da Autoridade Independente de Radiodifusão da Zâmbia, Guntila Muleya, lançou uma luz dura sobre uma tendência perturbadora que assola muitas nações africanas: as consequências mortais da política de escritório. Este trágico incidente, inicialmente concebido como uma tática de intimidação que correu mal, revela os extremos a que alguns chegarão para garantir poder e influência dentro das instituições governamentais.

A Zâmbia, tipicamente conhecida pelas suas baixas taxas de criminalidade e vigilância comunitária, foi abalada por este ato de violência invulgar. Mas este evento não é um incidente isolado. É sintomático de um problema maior e mais insidioso: a feroz competição por cargos governamentais em toda a África. Surge a pergunta: por que são estes cargos, muitas vezes acompanhados de salários modestos, tão cobiçados? A resposta reside no poder não oficial que exercem - a capacidade de orquestrar lucrativos negócios políticos e económicos.

Da Tanzânia ao Quénia, do Uganda à Zâmbia, emerge um padrão perturbador. Diretores de serviços fiscais, departamentos de imigração e outras agências governamentais chave tornam-se frequentemente magnatas de negócios de facto nas suas jurisdições. Aproveitam as suas posições para criar redes intrincadas de corrupção, oferecendo taxas de impostos lenientes ou contratos favoráveis em troca de pagamentos por baixo da mesa.

Este sistema cria um efeito em cascata de corrupção. O diretor no topo recebe somas substanciais de múltiplas fontes, enquanto os subordinados são pagos através de envelopes discretos, muitas vezes ganhando mais com estes pagamentos ilícitos do que os seus salários oficiais. É um ecossistema de corrupção autoperpetuante que alimenta todos os envolvidos, desde os funcionários de mais alto escalão até aos funcionários de mais baixo nível.

As consequências desta corrupção generalizada são terríveis e de longo alcance. A riqueza privada acumula-se à custa dos cofres do governo, levando a serviços públicos e infraestruturas subfinanciados. Os projetos públicos sofrem à medida que os contratos são adjudicados com base em subornos em vez de mérito, levando a trabalhos de qualidade inferior e até a acidentes fatais. No Quénia, por exemplo, um edifício inteiro desabou devido a cantos cortados e a funcionários subornados, resultando em perdas de vidas desnecessárias.

A denúncia é rara neste ambiente. O sistema está tão entrincheirado que expô-lo poderia significar perder o sustento ou pior. A recente tragédia na Zâmbia serve como um lembrete sombrio das potenciais consequências de cruzar interesses poderosos. Esta cultura de silêncio perpetua o ciclo da corrupção, tornando-o cada vez mais difícil de quebrar.

Esta epidemia de corrupção não é apenas sobre dinheiro; é sobre a erosão da confiança pública e a decadência das instituições destinadas a servir o povo. Inflaciona os custos, sufoca o crescimento económico e alarga o fosso entre a elite e o cidadão comum. Quando sistemas críticos como os exames são comprometidos, a validade das qualificações torna-se questionável. Isto leva a uma desconfiança mais ampla nas capacidades dos nacionais, afetando a reputação da nação a nível global.

Por exemplo, se as cartas de condução emitidas por um país não são fidedignas, isso mina a confiança em todos os titulares de cartas, representando um perigo para a segurança pública. Da mesma forma, quando passaportes e outros documentos oficiais são percebidos como facilmente falsificados ou obtidos de forma corrupta, isso semeia dúvidas entre as autoridades fronteiriças em todo o mundo. Esta desconfiança dificulta as viagens e os negócios internacionais, isolando ainda mais a nação.

Em países onde os cidadãos desconfiam das suas instituições, os efeitos em cadeia são profundos. Os empregadores locais podem preferir contratar estrangeiros, assumindo que são mais qualificados do que os seus compatriotas. Isto não só prejudica a autoestima nacional, como também sufoca o talento local. A falta de fé nos profissionais nacionais estende-se a setores críticos como a saúde, onde até os ministros do governo podem procurar tratamento médico no estrangeiro, destacando uma crise de confiança nos médicos e sistemas de saúde locais.

Com o tempo, esta desconfiança generalizada corrói o sentimento patriótico. Quando as pessoas perdem a fé na integridade das suas instituições, tornam-se cínicas e egoístas, entrincheirando ainda mais as práticas corruptas. O resultado é um ciclo vicioso onde a corrupção gera mais corrupção e os valores sociais decaem.

Como africanos, devemos enfrentar esta questão de frente. Precisamos de mecanismos de supervisão mais fortes, proteção para os denunciantes e uma mudança cultural que dê prioridade à integridade em detrimento do ganho pessoal. A solução reside numa revolução cultural e mental. Os cidadãos devem exigir transparência, responsabilização e adesão às regras. Só defendendo estes princípios se pode restaurar a confiança nas instituições, abrindo caminho para uma sociedade mais justa e próspera.

O caminho a seguir é desafiante, mas a alternativa - um continente onde o serviço público se torna uma fachada para o enriquecimento pessoal e onde os desacordos podem tornar-se mortais - é inaceitável. A trágica morte de Guntila Muleya deve servir de alerta. É tempo de as nações africanas atacarem as causas profundas da corrupção e criarem sistemas onde o serviço público signifique realmente servir o público, e não a si próprio. Isto requer um compromisso coletivo com a integridade, onde a corrupção não é tolerada e o Estado de Direito é respeitado. Só então poderemos esperar construir um futuro onde as nossas instituições trabalhem para o benefício de todos os cidadãos, e não apenas de alguns poucos privilegiados.

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