Angola é um país de contrastes e paradoxos: tem um enorme potencial de desenvolvimento, estando entre os três maiores produtores de petróleo de África, mas uma grande parte dos mais de 35 milhões de angolanos vive abaixo do limiar da pobreza, com menos de dois dólares por dia.
As esperanças que se seguiram ao fim da sangrenta guerra civil — que, com
algumas interrupções, durou 27 anos, entre 1975 e 2002, causando 500.000 mortos
e um milhão de deslocados — continuam, em grande parte, por se concretizar. A
inflação e o desemprego, especialmente juvenil, são um lastro pesado para um
crescimento económico impulsionado pelos hidrocarbonetos e que não irradia para
as classes médio-baixas. De acordo com as últimas previsões do Fundo Monetário
Internacional ( FMI ), Angola será ultrapassada este ano pelo Quénia como a
terceira maior economia de África, depois da África do Sul, da Nigéria e da
Etiópia. A recuperação económica angolana pós-Covid-19, segundo o FMI ,
estagnou de facto e o rácio dívida/ PIB também aumentou para 84% até ao final
de 2023.
Angola, por outro lado, mudou muito desde o fim da guerra civil: nos últimos vinte anos, a sua produção de petróleo quadruplicou, ao ponto de ser atualmente considerada um dos maiores produtores do continente africano, a par da Nigéria e da Líbia. A extração concentra-se principalmente nos campos “off-shore” do norte, ao largo do exclave de Cabinda, a norte do estuário do rio Congo, mas existem vários outros campos. Luanda, depois de uma ligeira quebra, pretende relançar a produção e, no final de 2023, anunciou a sua saída da Organização dos Países Exportadores de Petróleo ( OPEP ) a partir de janeiro de 2024, devido a um diferendo sobre a redução das quotas, seguindo neste percurso a Indonésia, o Qatar e o Equador.
Luanda, ao mesmo tempo que aumenta a produção de petróleo, pretende implementar uma estratégia de diversificação da economia. Esta última é uma das prioridades do Presidente João Lourenço, expoente do histórico partido do governo, Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), confirmado para um segundo mandato nas eleições de 2022. E é justamente o desejo de diversificar a economia que abre espaço para novas parcerias que possam oferecer perspetivas de desenvolvimento ao país.
Se no sector petrolífero já existe uma presença generalizada de empresas ocidentais — como a Exxon Mobil, Chevron, Eni, Bp, Shell, Total — que muitas vezes operam em joint-ventures com a companhia petrolífera nacional Sonangol, a China está entre os principais beneficiários das exportações angolanas de petróleo, e também noutros sectores, a começar pelas infraestruturas, a presença chinesa tem desempenhado a “parte de leão” na reconstrução pós-guerra civil. De acordo com o Banco Mundial, Angola deve aos credores chineses quase 21 mil milhões de dólares.
Mas os EUA estão agora a mostrar um interesse crescente em desenvolver a sua parceria com Angola, na sequência da vontade do Presidente João Lourenço de diversificar a economia. Luanda foi meta de uma visita do Secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, no passado mês de janeiro. E é neste país que se desenrola um dos dossiers mais importantes para a administração americana no que diz respeito ao desenvolvimento infraestrutural do continente africano: o Corredor do Lobito, para o qual Washington atribuiu mil milhões de dólares. É «o maior investimento de sempre dos Estados Unidos em Angola», assim o classificou o Presidente norte-americano Joe Biden, ao receber o homólogo angolano João Lourenço na Casa Branca, a 30 de novembro. O Corredor tem o nome do Lobito, o principal porto de Angola, e consiste numa linha férrea que, até à data, se estende por cerca de 1.600 km desde a costa do Oceano Atlântico até Kolwezi, no interior da República Democrática do Congo. Os planos para a sua extensão visam ligar Kolwezi a Lumumbashi, capital de Katanga (no sul da República Democrática do Congo) e, a partir daí, à Zâmbia. A importância económica e geopolítica do projeto deve-se ao facto de Katanga e a Zâmbia fazerem parte da chamada “cintura do cobre” e serem territórios muito ricos em minerais preciosos como o cobalto, a columbite-tantalite e o lítio.
A China, no entanto, não está de braços cruzados e o Chefe de Estado angolano fez uma visita significativa a Pequim em março passado, onde se encontrou com o Presidente Xi Jinping. Na ocasião, as relações bilaterais entre Pequim e Luanda foram elevadas a “parceria de cooperação estratégica global”, enquanto Xi garantiu que a China pretende «ajudar Angola na modernização agrícola, industrialização e diversificação económica».
O grande potencial de desenvolvimento de Angola não resolve, no entanto, o problema da riqueza que tem dificuldade de chegar aos cidadãos. O relatório “Quebrar o silencio”, divulgado no início do ano pela ONG Care International, coloca o país no topo das crises humanitárias mais negligenciadas pelos media internacionais: 7,3 milhões de angolanos sofrem com esta situação. Entre os principais problemas contam-se a pesada herança da guerra civil, com cerca de 1 milhão de minas espalhadas no território que continuam a constituir uma ameaça, as catástrofes naturais e o facto de apenas 28% da população das zonas rurais ter acesso à água potável.
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