O investigador Luís Bernardino considera que uma Cabinda desligada de Angola seria rapidamente absorvida por outros países da região, defendendo soluções que passem por um referendo e uma mudança de postura de independentistas e do Governo angolano.
O investigador do Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa (CEI-IUL) disse à Lusa que a questão de Cabinda foi sempre “complexa” para o Estado angolano, e não recebeu a devida atenção “por ter ficado diluída” devido à guerra civil de quase três décadas após a independência.
“O que tem estado associado a esta questão é sempre uma vontade de Cabinda se autonomizar relativamente a Angola”, enquanto o Governo angolano (apoiado pelo MPLA, partido no poder desde 1975) tem outro entendimento e sempre teve uma postura “muito pouco atenta” a estas pretensões, explicou o também docente.
A região de Cabinda tem sido, assim, mantida sob um regime especial, com uma forte presença militar e é através desta militarização da província que se exerce também o controlo político, considerou.
Luís Bernardino defendeu que qualquer solução para Cabinda deve passar por um referendo que permita avaliar qual o sentimento da população sobre esta questão, e se é mais favorável à autonomia, independência, ou manter a ligação a Angola, procurando que esta decisão não seja influenciada pelas potências regionais à volta daquela província do norte de Angola, mas descontinuada geograficamente.
“Esse é que é o problema, se Cabinda se tornasse uma província desligada de Angola, automaticamente vai ser absorvida pelas potencias regionais que estão à volta”, como a República Democrática do Congo e outros que têm interesse nas riquezas da região, essencialmente o petróleo, sublinhou o especialista em defesa e segurança.
No entanto, “manter esta situação pela força, vai desgastar, até criar o que pode ser uma tensão regional, que pode levar a uma militarização, uma área de conflito que não interessa nem a Angola nem às populações ou às FLEC [Frente para a Libertação do Enclave de Cabinda-Forças Armadas de Cabinda], que estão envolvidas neste processo político”, comentou.
O académico sugeriu que poderia encontrar-se um processo que tornasse Cabinda numa região autónoma gerida por Angola, o que não seria fácil de aceitar por Luanda, reconheceu, mas iria aliviar a tensão.
Quanto à FLEC, considerou que deve evoluir para uma força política, em vez de continuar associada a um movimento militar independentista, e “moderar o seu discurso e a sua forma de atuar, tanto internamente, na província de Cabinda, como externamente”, já que o movimento se esforça por manter uma política externa dinâmica e viva.
Apesar de a FLEC manter algumas ações de guerrilha contra as forças armadas angolanas em Cabinda, Luís Bernardino disse acreditar que a sua maior força está no exterior, na sua capacidade internacional de tentar mobilizar o apoio de outros países da região para a sua causa.
“Isso é algo que pode transformar este conflito, levar a que este conflito possa extravasar a própria dimensão de Cabinda e incluir outros atores não só africanos, mas também europeus”, observou.
“Às FLEC interessa-lhes internacionalizar o conflito (…) colocar a questão de Cabinda na agenda internacional para que tenha maior dimensão, enquanto aos países que têm ligação com Angola interessa o contrário”, prosseguiu o investigador, salientando que Portugal nunca se deverá envolver nesta questão, “não só pelas razões históricas, mas também pelo impacto que tem naquilo que é a sua política externa”.
Considerou, por outro lado, que a realização de um referendo seria um passo para que Angola “desse voz” ao povo cabindense, partindo-se daí para uma negociação partilhada sobre uma eventual autonomia.
“Mas isto passa por uma mudança radical das FLEC. Há aqui uma tensão latente em que ambas as partes estão extremadas (…) esta situação está a ser mantida um bocado pela força, até quando não sabemos, mas há aqui situações muito complexas e isto implica obviamente uma mudança de postura de ambas as partes”, comentou.
A FLEC mantém há vários anos uma luta pela independência do território, de onde provém grande parte do petróleo angolano, alegando que o enclave era um protetorado português - tal como ficou estabelecido no Tratado de Simulambuco, assinado em 1885 - e não parte integrante do território angolano.
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