Em Angola, fala-se muito de proporcionalidade. Um termo, muito querido pelo MPLA, serve para justificar tudo — da força policial contra estudantes desarmados à distribuição de comida em tempos de campanha. Mas a pergunta que não se quer calar é: "Há proporcionalidade entre o vandalismo de cima e o vandalismo de baixo?"
Vamos lá.
O vándalo do bairro quebra um banco de jardim.
* Prisão imediata;
* Processo sumário;
* Condenação exemplar; e
* A imprensa do regime grita: "Juventude alienada! Falta de valores!
Subversão!"
O vándalo engravatado desvia 50 milhões de dólares do Fundo Soberano.
* Ganha um novo cargo;
* Vai estudar em Londres;
* Palestra sobre “boa governação” num fórum financiado por... mais fundos
públicos;
* E se for apanhado, a justiça diz: "Estamos ainda a
investigar..."
Proporcionalidade? Vamos fazer as contas. Um jovem que quebra um vidro da
Sonangol porque não aguenta mais o preço da gasolina leva 6 meses de cadeia.
O "lotador" é analisado por sociólogos, cientistas políticos que
nunca acertaram, porque polícia sem culpa formada prende-o e leva para cadeia.
Um ex-ministro que “perde” 2 mil milhões de kwanzas num contrato fantasma
com empresa inexistente, leva férias em Lisboa com a família e segurança paga
pelo eleitor.
Mas não, calma. Dizem-nos: "Há formas civilizadas de protestar."
Claro, como a dos dirigentes que protestam contra a pobreza... usando jactos
privados.
A pergunta filosófica do dia é:
Quem é o verdadeiro vándalo? O jovem com fome que parte um vidro? Ou o
gestor com três mestrados que parte o país inteiro em parcelas, e o vende aos
seus camaradas?
De que é feita a cadeia? Parece que as cadeias em Angola só têm espaço para
véndalos de chinelos. Aqui, a proporcionalidade falha.
Se vens do Zango ou da Vila Alice, cuidado: qualquer cartaz te torna
terrorista.
Mas se és elites do MPLA, tens um palácio e contas em Dubai, és um “homem
de negócios”.
Proporcionalidade?
Em Angola, o que é pequeno é punido com peso de Estado; o que é grande torna-se
o próprio Estado.
Como fazer justiça? Talvez devêssemos aplicar a proporcionalidade inversa:
Por cada milhão desviado, 10 anos de cadeia e restituição pública com juros e
correcção monetária.
Por cada jovem preso por protestar, um político devia ser forçado a viver
um mês com o salário mínimo nacional (22 mil kwanzas, se sobrar algo depois da
inflação).
Recado final: o estado de sítio, que o senhor proporcionalidade tenciona impor
Angola, será o momento de satisfação ideológica do MPLA que só vive escalando a
violência para resolver o problema de sua manutenção no poder. Desta vez, é a
derrocada final do MPLA e seus estrategas porque a proporcionalidade agora
ficou invertida.
O povo está do outro lado da barricada. Porque, o verdadeiro vandalismo não
é o que se faz com paus e pedras, mas com canetas, decretos e silêncio
institucional.
O jovem que se revolta é consequência.
O dirigente que saqueia é a causa.
Portanto, da próxima vez que falarem de vandalismo nas manifestações,
deve-se perguntar:
“E os vándalos de fato e gravata, quando vão assumir o mal que fazem
Angola?”
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