A Juíza Conselheira Emiliana Margareth Morais Nangacovie Quessongo emitiu uma declaração de voto vencido no Acórdão n.º 994/2025, manifestando profunda discordância com a decisão maioritária do Tribunal Constitucional de rejeitar o pedido da UNITA para uma distribuição proporcional dos lugares na Comissão Nacional Eleitoral (CNE).
Na declaração, a juíza critica três pilares da decisão do plenário: a recusa do Tribunal em apreciar detalhadamente a matéria alegando tratar-se de “reserva dos partidos políticos”; a não aplicação do método de Hondt para cálculo da proporcionalidade; e a conclusão de que não houve violação de princípios constitucionais.
Segundo Margareth Quessongo, a matéria em causa toca o cerne do princípio democrático e da confiança no processo eleitoral, pois envolve a representatividade na composição da CNE, órgão crucial na gestão das eleições em Angola. “A representatividade não é só um critério de justiça política, é um factor de inclusão, de coesão e de unidade colectiva”, sublinhou.
A juíza defende que os partidos políticos devem ser representados na CNE de forma proporcional à sua expressão eleitoral no Parlamento, e não agrupados genericamente sob os rótulos de “maioria” e “minoria”. “Nada mais objectivo e coerente que aplicar o mesmo método utilizado para determinar a proporcionalidade de assentos no Parlamento para distribuir os assentos na CNE, respeitando a maioria e as minorias — no plural”, frisou.
Citando autores como Gomes Canotilho, Maria Lúcia Amaral, Martônio Lima e Paulo Sousa, a magistrada recorda que o princípio democrático não pode ser reduzido à simples supremacia numérica da maioria, devendo garantir também o respeito, a voz e a participação efectiva das minorias. “A maioria não existe em si mesma. Existe porque existem minorias”, escreveu, defendendo que o funcionamento democrático requer diálogo, negociação e consensualidade.
A proposta da UNITA, que pretendia a cedência de dois lugares por parte dos partidos com maior representação parlamentar a favor dos com menor expressão, é vista pela juíza como equilibrada e compatível com os princípios constitucionais. “A Requerente consente até um sacrifício maior de dois lugares, ao contrário do partido maioritário, que cede apenas um. Esta postura revela esforço de equilíbrio e respeito pelo pluralismo”, argumentou.
A juíza também alertou para o risco de se instalar um “défice de democracia” e “perda de poder democrático” se a composição da CNE não for vista como parte integrante da integridade eleitoral, que abrange todas as fases — do pré ao pós-eleitoral. “O processo eleitoral só é credível se as suas instituições forem constituídas com justiça e equilíbrio desde o início”, enfatizou.
No seu voto vencido, Margareth Quessongo reafirma que o Tribunal Constitucional não está vinculado às alegações das partes, e que deveria ter exercido plenamente o seu papel de garante da Constituição, atendendo ao princípio da supremacia constitucional consagrado no artigo 6.º da CRA.
A posição da juíza reacende o debate sobre a transparência e o equilíbrio
na composição da CNE, num momento em que se aproximam as eleições gerais de
2027 e aumenta a pressão por reformas que garantam maior confiança no sistema
eleitoral angolano.
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