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Mais do que indultos "é necessária uma justiça justa em Angola"

O debate sobre o indulto presidencial, concedido por João Lourenço para os 50 anos da independência de Angola, levantou discussões no país. A UNITA defende uma amnistia geral para extinguir condenações, em vez de um indulto que beneficie, a partir de 1 de Janeiro de 2025, figuras como José Filomeno dos Santos, activistas e uma influenciadora digital. O Bastonário da Ordem dos Advogados de Angola, José Luís Domingos, afirma que "mais do que mecanismos políticos é preciso uma justiça mais justa no país".

O debate sobre o indulto presidencial, decretado no contexto dos 50 anos da independência de Angola, tem gerado discussões no cenário político e jurídico no país. A partir de dia 1 de Janeiro de 2025, cidadãos condenados, como José Filomeno dos Santos, filho do antigo Presidente José Eduardo dos Santos, activistas e uma influenciadora digital, vão ser beneficiados pela medida. No entanto, o grupo parlamentar da UNITA, o maior partido da oposição, defende uma amnistia geral, que extinga “todos os processos de condenação marcadamente levados a cabo por motivações políticas”, argumentando que o indulto não aborda as profundas falhas do sistema judicial angolano.

A UNITA considera que, em vez de um indulto, uma amnistia geral seria uma medida mais eficaz para resolver as questões relacionadas às condenações com motivações políticas. O partido argumenta que a amnistia não só perdoaria os condenados, mas também extinguiria os processos, oferecendo uma solução mais abrangente para as injustiças que, segundo a oposição, ainda marcam o sistema judicial do país.

Questionado sobre o estado do sistema judicial no país, o Bastonário da Ordem dos Advogados de Angola (O.A.A.), José Luís Domingos, considera que mais importante do que recorrer a indultos ou amnistias, é a criação de um sistema judicial eficiente e justo.“Nós temos que perceber as competências constitucionais que o Presidente da República pode exercer. Neste caso, o indulto está constitucionalmente previsto. A amnistia acaba por ser uma competência da Assembleia Nacional, também constitucionalmente prevista e que acabam tendo na base a perspectiva de perdoar pessoas que tenham decisões já transitada em julgado. Mas, mais do que encontrarmos mecanismos políticos de alteração ou perdão, há pessoas que foram condenadas e a minha grande preocupação está focada ao funcionamento de uma justiça justa", explica.

José Luís Domingos destaca a gravidade dos problemas estruturais enfrentados pelos tribunais em Angola, como a sobrecarga de juízes e a falta de recursos financeiros: “Temos juízes com 2000 processos e que só podem julgar um caso por dia, devido à falta de infra-estrutura. Os tribunais não têm autonomia financeira, o que limita a capacidade de operar com eficiência”, descreve. Para o Bastonário da Ordem dos Advogados de Angola, a falta de condições nos tribunais é uma questão mais urgente do que as medidas políticas de indulto ou amnistia.

O Bastonário da Ordem dos Advogados diz estar preocupado com o impacto das falhas do sistema judicial para a população angolana, enfatizando que, enquanto a justiça continuar a funcionar de maneira ineficaz, com prisões superlotadas e processos lentos, as verdadeiras injustiças continuarão a afectar os cidadãos mais vulneráveis. “Nós temos problemas estruturais muito, muito fortes que precisam ser atacados com prioridade. O que deve melhorar é mesmo a justiça e não apenas situações paliativas”, afirmou José Luís Domingos, ressaltando que o foco principal deve ser a construção de um sistema judicial mais humano e eficiente. A transformação da justiça angolana passa pela construção de "um Estado de Direito robusto", acrescentou.

Para José Luís Domingos é preciso "criar um sistema de justiça eficiente, justo e independente. Isso será feito quando conseguirmos entender que não há outro caminho para edificar um país senão o Estado de Direito. E o Estado de Direito faz-se com tribunais independentes do poder político”.

Mais do que medidas pontuais como o indulto, é essencial melhorar as condições de funcionamento dos tribunais e garantir a autonomia financeira da justiça. “Os tribunais raramente desembolsam mais do que 20 ou 30% da verba aprovada pelo Parlamento. Isso condiciona a própria desenvoltura do tribunal”, descreveu, enfatizando que a falta de recursos financeiros tem um impacto directo na eficiência do sistema judicial.

Para o Bastonário da Ordem dos Advogados de Angola, a injustiça não deve ser uma preocupação exclusiva de figuras públicas, mas uma questão que envolva toda a sociedade. “A injustiça deve mobilizar a sociedade quando está em causa qualquer cidadão, e não apenas os que têm notoriedade. As grandes injustiças em países como o nosso estão direccionadas, infelizmente, aos mais necessitados”, defendeu.

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