O texto para hoje seria diferente se o Presidente Joe Biden estivesse a realizar a sua visita oficial, a primeira de um Presidente norte-americano ao nosso País. Infelizmente, a história ficou escrita de forma diferente e vamos guardar esses escritos para outra altura, a fazer fé na palavra do Presidente dos EUA, ainda que este também seja um político e, como sabemos, a palavra dos políticos vale o que vale! De qualquer modo, há mais do que esperanças, há indícios e passos para que tal ocorra em tempo útil.
Ainda assim, a viagem do
Presidente dos Estados Unidos da América mexeu com a vida política, económica e
social do nosso país nos últimos tempos. A euforia de todos esmoreceu-se com as
notícias do seu adiamento, mas cria estranheza ter tanta gente em Angola a
maldizer a viagem. São opções e visões. Respeitemos ainda assim, embora fique o
substracto dum certo negativismo social, de pessoas que torcem para que as
coisas entre nós corram mal. É um pessimismo assustador, que respaldado nas
dificuldades do quotidiano desacredita em tudo e todos.
Para além do que escapa
ao olhar imediato, é obvio que a questão energética, seja do petróleo, mas
principalmente da transformação energética, é um dos drives principais dessa
missão. Não menos importante é o Corredor do Lobito para onde estão a confluir
inúmeros interesses, uma vez que se trata de uma zona rica em minerais
absolutamente imprescindíveis no quadro das novas tecnologias, nomeadamente o
lítio, cobalto, cobre manganês, entre outros, procurando assim fontes que
possam alimentar o seu arsenal industrial, numa disputa clara com a China.
A situação geográfica de
Angola e as suas infra-estruturas acabaram por representar uma vantagem a
priori. É importante podermos criar sinergias com os parceiros países
limítrofes para uma abordagem de complementaridade ao invés de competição. É
isso que vem ao de cima quando vemos notícias de que a RDC estaria interessada
numa nova rota para então transportar os minérios pelo porto de Banana. É
curioso notar que numa distância inferior, os portos de Hamburgo (Alemanha),
Antuérpia (Bélgica) e Amsterdão (Países Baixos) não se digladiam. Ainda assim,
o corredor do Lobito está a reduzir os tempos de entrega dos minérios. Fala-se
duma redução na ordem dos vinte e um dias, passando de vinte oito para sete
dias.
Sem dúvidas, Angola
continua a ser uma carta importante da agenda política internacional. Não só
porque corporiza em si uma grande atenção por causa mesmo do corredor do
Lobito, mas principalmente porque o país pode exercer um papel mais
significativo no continente, dependendo agora do nosso desdobramento em termos
diplomáticos e da nossa capacidade de empreender processos e liderar dinâmicas.
Nesta senda, João
Lourenço deve ainda fechar o ano com duas deslocações importantes. Primeiro,
deve ir à Paris e a seguir à próxima cúpula de líderes do G-20, no Brasil. Para
2025, o país recebe a liderança rotativa da União Africana, sendo por isso
importante que de denotem mais elementos sobre a agenda política de Angola para
a organização continental: que visão? Que metas? Como engajar
os outros líderes e países?
Há, como é evidente,
temas que não podem ficar de fora, em alinhamento com outros documentos
estruturantes, como a Agenda 2063 da União Africana ou ainda a Visão SADC 2050.
Falo, por exemplo, do combate à fome e à pobreza; do combate à instabilidade e
dos focos de conflito que persistem em algumas sub-regiões; podemos por fim
referir o tema da electrificação, industrialização e da zona do livre comércio,
onde, obviamente, o ambiente de negócios, a produtividade e competitividade ou
as potencialidades de cada um jogam um papel para além de que é mister falarmos
do gap de infra-estruturas e a fraca interconectividade entre os nossos países,
para que a mobilidade possa ser feita de forma mais autónoma – não podemos
achar normal que, para chegar à Tanzânia ou ao Benin, tenhamos, muitas vezes,
de ir à Europa conseguir as conexões. Sob qualquer um deles, haveria muito para
se dizer, mas é fundamental que não dispersemos o foco e nos possamos
direccionar num objectivo, fixando nesses 12 meses um calendário rigoroso de
realizações para o mandato de Angola na Presidência da União Africana. É
importante que a organização regional seja mais do que as reuniões e viagens. É
importante que os nossos cidadãos (africanos no geral) consigam assimilar a sua
relevância.
Se é certo que uma vinda
de Joe Biden colocaria Angola numa outra posição em termos geopolíticos, a
verdade é que a não vinda de Biden nos deixa na mesma posição e, nesse sentido,
não somos um player desprezível, pelo contrário ganhamos cada vez maior
expressão e precisamos de tirar proveito disso em todos os sentidos. Insisto, só
devemos persistir no nosso trabalho de casa. Preservar a estabilidade política,
mas assegurar melhor condição de vida ao nosso povo, sendo prioridades resolver
com urgência o tema da fome, do custo de vida, do emprego, da educação, da
saúde, saneamento e infraestruturas.
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