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2025: Notas para agenda de Angola na liderança da União Africana - Adebayo Vunge

O texto para hoje seria diferente se o Presidente Joe Biden estivesse a realizar a sua visita oficial, a primeira de um Presidente norte-americano ao nosso País. Infelizmente, a história ficou escrita de forma diferente e vamos guardar esses escritos para outra altura, a fazer fé na palavra do Presidente dos EUA, ainda que este também seja um político e, como sabemos, a palavra dos políticos vale o que vale! De qualquer modo, há mais do que esperanças, há indícios e passos para que tal ocorra em tempo útil.

Ainda assim, a viagem do Presidente dos Estados Unidos da América mexeu com a vida política, económica e social do nosso país nos últimos tempos. A euforia de todos esmoreceu-se com as notícias do seu adiamento, mas cria estranheza ter tanta gente em Angola a maldizer a viagem. São opções e visões. Respeitemos ainda assim, embora fique o substracto dum certo negativismo social, de pessoas que torcem para que as coisas entre nós corram mal. É um pessimismo assustador, que respaldado nas dificuldades do quotidiano desacredita em tudo e todos.

É facto que há razões geopolíticas e económicas muito fortes subjacentes ao interesse dessa visita, colocando Angola no centro da política mundial. Como relembrei recentemente, o grande barão da diplomacia norte-americana, Henry Kissinger, afirmava que “a América se move por interesses” e é, portanto, isso que preside essa deslocação.

Para além do que escapa ao olhar imediato, é obvio que a questão energética, seja do petróleo, mas principalmente da transformação energética, é um dos drives principais dessa missão. Não menos importante é o Corredor do Lobito para onde estão a confluir inúmeros interesses, uma vez que se trata de uma zona rica em minerais absolutamente imprescindíveis no quadro das novas tecnologias, nomeadamente o lítio, cobalto, cobre manganês, entre outros, procurando assim fontes que possam alimentar o seu arsenal industrial, numa disputa clara com a China.

A situação geográfica de Angola e as suas infra-estruturas acabaram por representar uma vantagem a priori. É importante podermos criar sinergias com os parceiros países limítrofes para uma abordagem de complementaridade ao invés de competição. É isso que vem ao de cima quando vemos notícias de que a RDC estaria interessada numa nova rota para então transportar os minérios pelo porto de Banana. É curioso notar que numa distância inferior, os portos de Hamburgo (Alemanha), Antuérpia (Bélgica) e Amsterdão (Países Baixos) não se digladiam. Ainda assim, o corredor do Lobito está a reduzir os tempos de entrega dos minérios. Fala-se duma redução na ordem dos vinte e um dias, passando de vinte oito para sete dias.

Sem dúvidas, Angola continua a ser uma carta importante da agenda política internacional. Não só porque corporiza em si uma grande atenção por causa mesmo do corredor do Lobito, mas principalmente porque o país pode exercer um papel mais significativo no continente, dependendo agora do nosso desdobramento em termos diplomáticos e da nossa capacidade de empreender processos e liderar dinâmicas.

Nesta senda, João Lourenço deve ainda fechar o ano com duas deslocações importantes. Primeiro, deve ir à Paris e a seguir à próxima cúpula de líderes do G-20, no Brasil. Para 2025, o país recebe a liderança rotativa da União Africana, sendo por isso importante que de denotem mais elementos sobre a agenda política de Angola para a organização continental: que visão? Que metas? Como engajar os outros líderes e países?

Há, como é evidente, temas que não podem ficar de fora, em alinhamento com outros documentos estruturantes, como a Agenda 2063 da União Africana ou ainda a Visão SADC 2050. Falo, por exemplo, do combate à fome e à pobreza; do combate à instabilidade e dos focos de conflito que persistem em algumas sub-regiões; podemos por fim referir o tema da electrificação, industrialização e da zona do livre comércio, onde, obviamente, o ambiente de negócios, a produtividade e competitividade ou as potencialidades de cada um jogam um papel para além de que é mister falarmos do gap de infra-estruturas e a fraca interconectividade entre os nossos países, para que a mobilidade possa ser feita de forma mais autónoma – não podemos achar normal que, para chegar à Tanzânia ou ao Benin, tenhamos, muitas vezes, de ir à Europa conseguir as conexões. Sob qualquer um deles, haveria muito para se dizer, mas é fundamental que não dispersemos o foco e nos possamos direccionar num objectivo, fixando nesses 12 meses um calendário rigoroso de realizações para o mandato de Angola na Presidência da União Africana. É importante que a organização regional seja mais do que as reuniões e viagens. É importante que os nossos cidadãos (africanos no geral) consigam assimilar a sua relevância.

Se é certo que uma vinda de Joe Biden colocaria Angola numa outra posição em termos geopolíticos, a verdade é que a não vinda de Biden nos deixa na mesma posição e, nesse sentido, não somos um player desprezível, pelo contrário ganhamos cada vez maior expressão e precisamos de tirar proveito disso em todos os sentidos. Insisto, só devemos persistir no nosso trabalho de casa. Preservar a estabilidade política, mas assegurar melhor condição de vida ao nosso povo, sendo prioridades resolver com urgência o tema da fome, do custo de vida, do emprego, da educação, da saúde, saneamento e infraestruturas.

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