A defesa das cerca de 200 pessoas condenadas por rebelião na província angolana da Lunda Sul considerou hoje que o processo teve “razões políticas" e não jurídicas e visou inibir o exercício das liberdades de manifestação na região.
“Tem sim algum cunho político,
porque nos parece que a ideia é reprimir qualquer tentativa de quem tenta
reclamar sobre a autonomia ou independência daquela zona, mas entendemos que a
questão de fundo das reclamações daquela comunidade tem a ver com condições
sociais, a pobreza”, afirmou hoje o advogado Guilherme Neves.
Em declarações à Lusa, o presidente da Associação Mãos Livres, organização
não-governamental angolana promotora dos direitos humanos e defensora dos 198
cidadãos condenados por rebelião e participação em motim, considerou tratar-se
de um processo “meramente político”.
Para a Mãos Livres, que recorreu da decisão, o Tribunal da Comarca de
Saurimo não provou grande parte das acusações imputadas aos arguidos.
“Porque reclamar um direito não pode significar prisão”, frisou Guilherme
Neves, salientando que os cidadãos, à data dos factos (outubro de 2023) não
provaram qualquer motim.
“Entendemos que não houve motim algum, eles (efetivos da polícia)
provocaram o motim e o povo em nenhum momento se rebelou. Era uma manifestação
pacífica só que foi interpretada como uma rebelião”, argumentou.
Independentemente de ser uma “comunidade abençoada” com recursos naturais,
como diamantes, realçou o responsável, a pobreza extrema e a falta de
oportunidades na região das lundas deram azo àquela “manifestação pacífica”,
insistiu.
Perto de 200 pessoas foram condenadas pelo Tribunal da Comarca de Saurimo
com penas entre os dois e oito anos de prisão pelos crimes de associação
criminosa, rebelião, participação em motim e desobediência, na sequência de
tumultos registados em 2023.
São no total 198 arguidos condenados pelo referido tribunal, após estes
participarem em tumultos registados nos dias 07 e 08 de outubro de 2023, na
cidade de Saurimo, província angolana da Lunda Sul, leste de Angola, noticiou
na quarta-feira a Televisão Pública de Angola (TPA).
De acordo com o tribunal, ficou provado que os réus, com idades
compreendidas entre os 18 e 78 anos, entre homens e mulheres, desobedeceram à
ordem de dispersão da polícia nacional, marcharam até às imediações do palácio
do governo provincial arremessando pedras, garrafas e paus contra os agentes da
corporação.
Pelo menos três agentes da polícia ficaram feridos, na ocasião, e várias
viaturas foram danificadas, como realçou o juiz, citado pela TPA, salientando
que os autores eram membros do autodenominado Manifesto Jurídico Sociológico do
Povo Lundês.
Este manifesto é liderado por Jota Malakito, que defende a autonomia da
região da Lunda-Tchokwe em Angola, e tentou promover um ato de proclamação da
autonomia deste território.
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