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O CONCEITO DE RAÇA NEGRA COMO EFABULAÇÃO OCIDENTAL

 Não são poucas as teorias sobre a superioridade do homem branco, em relação ao homem negro, (preto ou africano se quiserem) bem como o carácter puritano da suposta raça branca. Muitas destas teorias tiveram estatuto científico e filosófico relevante durante séculos a fio, e seus cultores foram tidos como dos mais brilhantes intelectuais.

Entre os vários autores interessa-nos aqui dois que a meu ver foram fundamentais e sua influência no desenvolvimento do racismo é notória. Falo de Georges-Louis Buffon e Georg Friedrich Hegel (como se diz na linguagem popular, eram dois charás).

Buffon foi naturalista e matemático francês que fez uma das primeiras grandes classificações das raças, onde descreve o negro, como o protótipo de uma figura pré-humana incapaz de superar a sua animalidade, de se autoproduzir e de se erguer à altura do seu Deus. Fechado nas suas sensações, tem dificuldades de quebrar a cadeia de necessidades biológicas, razão pela qual não chega a moldar o seu mundo e a conceder a si mesmo uma forma realmente humana (ACHILLE MBEMBE, em Crítica da Razão Negra).

Por sua vez, Hegel, filósofo alemão, disse que os negros eram como estátuas sem linguagem nem consciência de si, entidades humanas incapazes de se despir de vez da figura animal com que estavam misturados. Era de sua natureza albergar o que estava já morto. Hegel conclui, que por esta facto os negros não possuem racionalidade que é a fonte da moral, do direito, da ciência, da arte e da História. 

Em sua obra Crítica da Razão Negra o filósofo camaronês ACHILLE MBEMBE chama a isso de ALTEROCÍDIO. O alterocídio é a negação do outro como semelhante a si, e, portanto, a justificação de sua objectivação e negação de sua subjectividade, factos bastantes para legitimar a sua dominação ou mortandade.

O conceito de raça, que dá legitimidade ao racismo, não passa de uma efabulação e demostra o quão a filosofia e demais ciências podem estar impregnadas de mitos. A efabulação é o processo que resulta da imaginação de um ou mais indivíduos que criam teorias sem qualquer base real ou comprovada. A classificação racial apega-se em fenómenos meramente externos como a cor da pele, ao invés de factos físicos, naturais ou genéticos. 

Na visão de ACHILLE MBEMBE a raça não possui um estatuto ontológico, isto é, a caracterização que foi feita ao negro não passa de um conjunto de narrativas  imaginárias baseando-se no que está fora e não dentro, nos invólucros e não no conteúdo. 

Estas efabulações contribuíram para justificar toda a empreitada violenta, a esclavagista e colonial contra a África e os africanos que eram tidos como objeto ou commodity (OBJECTIVAÇÃO) não humanos (ZOOMORFIZAÇAO) e maus por natureza (AFROPESSIMISMO).

O conceito de raça não passa de efabulação, pois, nenhum estudo no âmbito das ciências da natureza, comprovou experimentalmente, que existem diferenças conaturais entre brancos e negros. 

A História esta impregnada de factos sociais, políticos e outros de natureza diversa que representam a grandiosidade do homem chamado de Negro.  Um dos exemplos é a Revolução do Haiti. 

A Revolução do Haiti que culminou com a sua independência, foi perpetrada por negros escravos e a ela se deve uma das melhores constituições do mundo na época, isto é, em 1805, sensivelmente 20 anos após a independência dos Estados Unidos. “Esta constituição interdita a nobreza, instaura a liberdade de culto, critica os conceitos de propriedade e de escravatura, algo que a Revolução Americana nunca ousara fazer. A mesma constituição aboliu os nascimentos legítimos e ilegítimos e defendeu de forma elevada a igualdade racial e a liberdade universal”. (ACHILLE MBEMBE, Crítica da razão negra).

A Filosofia Africana tem a nobre missão de desfazer e desmoronar estas efabulações mitológicas sobre a África e os Africanos para que as novas gerações não vivam reféns destas narrativas mitológicas. 



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