Na sequência do "Epitáfio da Esperança" impunham-se algumas notas adicionais, tendo em conta que é tradição em várias nações do mundo a ideia de que a esperança não morra, jamais. Neste sentido é paradigmático o adágio italiano segundo o qual "quem tem esperança morre cantando".
Nem a (própria) morte destruiria a alegria de quem se entrega
à esperança. Na linha Iusitana de que "a esperança é a última coisa a
morrer", supostamente ela até sobreviveria à pessoa esperançosa, o que não
deixa de ser algo ficcional. Mas ficção e mentira são coisas diferentes, na
medida em que a ficção tende a ter uma mensagem útil subjacente e a mentira
dificilmente poderá ser positiva. Ainda assim, precisamos saber que a ficção é
ficção e a realidade é realidade.
Destarte, é sob o prisma da realidade que proponho uma abordagem segundo a qual a construção de uma realidade melhor deverá assentar sobre o cadáver da esperança. Esta já foi sagrada, idosa, sangrada e moribunda, no entendimento de diversos artistas desta terra. Antes de lhe escrever o epitáfio, na verdade fizemos o perfil da dita cuja, em "Esperança, sua malandra!".
Portanto, para a apropriada compreensão deste apontamento
recomendamos que sejam também lidos, nesta mesma ordem, "Esperança, sua
Malandra!" e "Epitáfio da Esperança".
Posto isso, proponho-me partilhar alguns pontos relativos às razões pelas quais entendo que a morte da esperança é mais realística e vantajosa que a insistência na ficção controladora de que ela sobrevive até à nossa própria morte:
1 - Se aceitarmos e insistirmos que a esperança é a última a morrer, seremos nós um meio ao serviço da esperança e não o contrário. A aceitar-se isso, será ela o fim último da humanidade e não o contrário. Tal como disse O Filho do Homem sobre o sábado (as leis e instituições), este deve estar ao serviço do homem e não o contrário.
2- Perante as proposições anteriores, assumido que as constatações feitas sobre a esperança em "Esperança, Sua Malandra!" e em "Epitáfio da Esperança" sejam razoavelmente correctas, não é do melhor interesse da vida humana que a esperança seja tida como mais importante que esta. É suposto estar a esperança ao serviço da vida e não o contrário.
Nesta linha de
raciocínio, se a persistência acrítica na esperança adia as soluções e prolonga
indefinidamente a dominação das pessoas sob a eterna promessa de dias melhores
algures num futuro mais fugidio que o horizonte, melhor será enterrar a
esperança para olharmos nos olhos uns dos outros e conversarmos sobre o que
podemos, nós próprios, fazer para que o futuro aconteça.
3- Se a esperança não serve para separarmos os abismos que nos impedem de realizar no futuro médio os nossos sonhos, como humanos, africanos e angolanos, será que o que designei de "Pessimismo Construtivo" tem esta serventia? Não!
Mas dá-nos a possibilidade de melhor aferirmos a realidade
conforme ela é, e não entorpecida pelos ópios e anestésicos usados como
ferramenta de dominação dos mais desfavorecidos. Tal é o caso da esperança, de
certas manifestações religiosas e outros artifícios mediante os quais quem
manda leva a que aqueles aos quais deveria servir se submetam à servidão de bom
grado.
4- Se o Pessimismo Construtivo também não nos tira dos pântanos do egoísmo e da autofagia a que a humanidade se está a entregar, o que podemos fazer? Bem, por incrível que pareça a resposta é a mais simples possível.
A solução é sermos mais humanos. Sobre a condição humana
recomendo o capítulo dedicado a este assunto no livro "A Estranha Ordem
das Coisas", de António Damásio. Sobre como sermos mais humanos, recomendo
os princípios defendidos por Stephen Covey nas suas diferentes obras, em
especial na obra "A Terceira Alternativa".
5- Sem prejuízo das recomendações acima, usando outras palavras para dizer o mesmo que Covey procurou designar Sinergia e Terceira Alternativa, todas as ideais por ele apresentadas parecem-me sintetizadas pelo princípio universal do que poderíamos chamar "Humanismo Aplicado", normalmente associado à ideia de UBUNTU.
6 - Dos estudos e desenvolvimentos do UBUNTU, para sua melhor compreensão os maiores especialistas deste princípio sistematizaram-no nos 5 PILARES, seguintes: I- AUTO-CONHECIMENTO; II- AUTO-CONFIANÇA ( mas sem arrogância); III - RESILIÊNCIA; IV - EMPATIA; V - SERVIÇO (no sentido de servir). Todos estes pilares acabam estando interligados, para compor e sustentar o edifício comum que será o homem ou a mulher comprometida com a sua imanente humanidade. Vale ainda assinalar que estes pilares funcionam melhor quando temperados com doses abundantes de INTEGRIDADE, RESPEITO E GENEROSIDADE.
Ilustro este apontamento com uma imagem em que apareço com a
minha penúltima filha, a Wamy Njolela. Desde logo porque os filhos são, por
definição, um fenómeno sinergético. Não são o pai, nem a mãe. E são mais que a soma de ambos. Faço-o também
porque ela, cujo nome composto (o primeiro em kimbundu e o segundo em umbundu)
significa meu júbilo, é do tipo de passoa cuja energia, generosidade e alergia
continuem um lembrete vivo do quanto devemos ser gratos pela vida, não obstante
as dificuldades e desafios com que ela se possa apresentar nos diferentes
pontos do tempo-espaço.
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