A artista plástica Daniela Ribeiro transitou para 2024 com a exposição “Mente Eléctrica”, patente no Palácio de Ferro até o dia 8 de Janeiro, Dia da Cultura Nacional, que se assinala na segunda-feira.
A exposição foi inaugurada na primeira semana de Dezembro, num acto testemunhado pelo ministro das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, Mário Oliveira, pelo ministro da Cultura e Turismo, Filipe Zau, e pela presidente do Tribunal Constitucional, Laurinda Cardoso.
Foi premiado o artista, explicou que nesta exposição
aborda essencialmente as doenças mentais que não são visíveis e a relação de
semelhança no processamento entre cérebro humano e o dispositivo electrónico
motherboard (placa-mãe).
A artista retrata, em 31 obras, a sua visão sobre o
futuro do homem e da tecnologia, com o seu espírito crítico e inovador,
repensando o seu trabalho e olhando para o constante avanço tecnológico com uma
perspectiva positiva. As 31 peças de arte exibem rostos africanos, reproduzidos
a uma escala quase sobre-humana, adornados com jóias que invocam a imagética da
ourivesaria africana tribal, utilizando ao invés de metais ou pedras preciosas,
peças obsoletas de diversos objectos electrónicos (computadores, telemóveis,
ecrãs, chips, teclados, auriculares, fios) que são desmontados e transformados
pelas suas mãos em peças escultóricas distintas.
"O uso das motherboard (placa-mãe) é um processo
de inteligência. É uma réplica daquilo que é a inteligência humana. Eu comecei
por usar o telemóvel porque eles representam justamente aquilo que é a
inteligência artificial. E só aí é que eu consigo colocar em diálogo o passado
primitivo e o hoje, completamente fanático da inteligência racional. Nós
estamos numa civilização em que o raciocínio lógico é mais valorizado do que a
manifestação emocional. Isso causa-nos muitos problemas. Porque a inteligência
verdadeira é emocional. Por isso, não só faço reciclagem dos telemóveis, como
também reciclo valores ancestrais”, defendeu.
No seu trabalho procura explorar a relação do homem
africano com as novas tecnologias, concretamente a inteligência artificial.
Daniela Ribeiro questiona o que pode acontecer ao ser humano com tanta
dependência do computador no seu dia-a-dia e como esta realidade tem
influenciado para a mudança de valores.
"Hoje, mal acordamos, ligamos o telefone, a
máquina de café, o micro-ondas, a torradeira, o carro, o computador e por ai
adiante. Pela dinâmica, hoje estes objectos são como muletas, sem os quais já
não vivemos. Na minha obra, penso que estou a provocar uma reflexão sobre
isso”, observou.
Segundo a artista, o méto- do de construção da sua
narrativa é moroso, implicando uma vida inteira num processo de experiências.
Sobre a exposição patente, Daniela Ribeiro salientou que demorou pouco mais de
sete meses a ser feita. Quanto aos rostos modelares, a artista detalhou que são
personagens que não existem na realidade tal como estão apresentados, visto que
foram todos alterados para terem uma imagem sã e próspera.
Percurso notável
Daniela Ribeiro é uma artista plástica angolana que
viveu no país os primeiro 20 anos da sua vida, tendo depois emigrado para
Europa, onde se estabeleceu em países como Portugal, França, Londres e
Espanha. Em Portal, em 1993 forma-se em Design, Imagem e Criação por
Computador, e em 1998 licencia-se em Relações Internacionais, na Universidade
Lusíada de Lisboa. Em 2000, frequenta o Curso de Pintura da Sociedade
Nacional de Belas Artes de Lisboa e é admitida em 2005 na escola Ar.Co, no
curso de Escultura. Em 2006 especializou-se em Moldes de Resina e Silicone na
Escola Pascal Rosier, em Paris, tendo sido convidada pelo Mestre Pascal Rosier
para ministrar aulas em Lisboa, onde assumiu, definitivamente, como artista.
Expõe internacionalmente desde 2002, em Portugal, Espanha, Inglaterra, Hong
Kong, Miami e Dubai. Em Angola destacou-se nas exposições: "A Unicidade do
tempo”, 2009; "O Olho Biónico”, Torres da Escom, 2010; "O Rosto de
Deus”, Museu Nacional de História Natural, 2012); "A Nossa Cultura”,
Academia BAI, 2013; "Andar nas Nuvens”, Centro Cultural Camões, 2015;
"How to be Global”, Centro Cultural Banco Económico, 2016. Ainda em 2016,
tem a exposição conjunta com a artista nigeriana Ndidi Emefiele, intitulada
"Global African Profiles”, exibida em Londres. Daniela Ribeiro foca
a sua carreira artística na inteligência artificial e nas pesquisas que tem
realizado sobre o assunto, enfatizando o seu foco principal na ideia de que o
homem passou de uma criação a ser o próprio criador. Projecta ainda a noção da
imaginação futurista do homem que, por meios tecnológicos e científicos,
consegue destacar-se pelas suas capacidades e realizações. A arte de Daniela
Ribeiro é uma experiência sensorial intrigante e estimulante que explora a
dinâmica da ingenuidade humana enquanto tenta continuamente ultrapassar as
barreiras da tecnologia.
Abordar as doenças mentais
Daniela Ribeiro traz igualmente como temática a
problemática das doenças mentais não visíveis que não deixam as pessoas viverem
e se relacionarem correctamente. Dentre estas, apontou como exemplo a apneia do
sono, que prejudica a relação da vítima com sua relação com a família, cônjuge,
colega, patrão, sem que as pessoas à volta notem.
"A bipolaridade, a esquizofrenia, a
obsessão, a compulsão, são doenças mentais. Por exemplo, uma pessoa muito
espontânea, que ri alto, incomoda. Uma pessoa que expressa angústia e desespero
é mal interpretada. O que vem do corpo, da biologia, tem de ser tudo
controlado. Estamos a desvalorizar as coisas humanas. Tudo que é do natural,
que vem do corpo, da biologia, tem de ser controlado, desde o cabelo, o cheiro,
as unhas, a pele, os dentes. Já não há uma aceitação da biologia. Estamos a ter
mudanças violentas”, alerta a artista em tom crítico.
Ainda sobre as doenças mentais, Daniela Ribeiro
expressou que a exposição levanta não apenas preocupações, bem como aponta uma
visão positiva daquilo que são as tecnologias a favor do homem. Na sua opinião,
as tecnologias serão muito úteis para a educação e para a saúde.
"Uma criança autista pode ter uma vida normal,
bastando ter um corrector eléctrico no cérebro que gere melhor todos os
impulsos que não estão a ser bem direccionados. Ou seja, os impulsos eléctricos,
semelhantes no cérebro humano e na máquina. Há aqui uma visão optimista, do
ponto de vista antropológico, em relação à máquina. Vejamos, por exemplo, que
agora as próteses são comandadas pelo cérebro”, observou.
No geral, Daniela Ribeiro pontuou que a sua obra fala
sobre África e a sua cultura num contexto actual, reflectindo especificamente
como o angolano se apresenta num contexto global e o seu posicionamento nesta
que é considerada a quarta revolução social.
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