A região da África Austral, composta por países dotados de abundantes recursos naturais, capital humano resiliente e um potencial estratégico inegável, encontra-se numa encruzilhada histórica. Mais do que apenas explorar as riquezas do subsolo e a sua posição geográfica privilegiada, é tempo de projetar um novo paradigma de cooperação inter-regional, capaz de conferir maior protagonismo no continente africano e no concerto das nações. A chave está na integração equilibrada, no fortalecimento da conectividade e numa diplomacia geoeconómica prudente, cautelosa, mas ambiciosa.
Os países da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) podem,
de forma coordenada, emergir como um bloco de influência geopolítica
estruturante. Combinando a estabilidade política relativa de algumas nações
(como Botsuana e Namíbia) com o peso económico da África do Sul, os recursos
minerais de Angola, a agricultura do Zimbabué e o potencial turístico de Moçambique,
pode-se criar uma frente unida para defender os interesses africanos tanto
junto ao Ocidente quanto ao Oriente, sem cair em dependências ou alianças
desequilibradas.
As relações com o *Ocidente* devem ser pautadas por uma assertiva defesa da soberania económica e pelo acesso justo a mercados, investimentos em tecnologia limpa e industrialização. Com o *Oriente*, particularmente a China e a Índia, deve-se negociar com sabedoria, evitando endividamentos predatórios e garantindo transferência real de conhecimento e tecnologia. Já com o *Norte de África*, importa estabelecer pontes comerciais e políticas, em especial nos setores logístico, de defesa e energético, aproveitando os portos do Mar Mediterrâneo como canais de entrada para produtos da África Austral nos mercados europeus e asiáticos.
*II. Conectividade Regional: Infraestrutura como Base da Integração*
A conectividade aérea, terrestre, marítima e ferroviária é o alicerce da
integração regional. A ausência de rotas eficientes encarece a circulação de
bens e pessoas, criando barreiras artificiais ao desenvolvimento.
* *Aérea:* É imperativo desenvolver hubs regionais, modernizar companhias
aéreas nacionais e criar acordos de céus abertos que permitam maior mobilidade
entre os países da região.
* *Terrestre e Ferroviária:* Corredores como o Trans-Kalahari e o Lobito
Corridor devem ser modernizados e expandidos, promovendo o escoamento de
produtos entre o interior do continente e os portos marítimos.
* *Marinha:* A cooperação portuária entre Angola (Lobito e Luanda), Namíbia
(Walvis Bay) e Moçambique (Beira e Nacala) deve ser reforçada, integrando
sistemas alfandegários e logísticos com tecnologia digital.
Estas ações não apenas reduzem custos logísticos, como *podem aumentar o
PIB de cada país entre 1,5% e 3% ao ano*, segundo estimativas do Banco Africano
de Desenvolvimento, caso as infraestruturas sejam devidamente articuladas com
políticas de facilitação do comércio.
*III. Cooperação Económica: Do Setor Petrolífero à Agroindústria*
A cooperação entre Angola e os seus vizinhos pode gerar oportunidades
"win-to-win" com alto valor agregado:
* *Setor Petrolífero:* A queda da produção petrolífera angolana — que
passou de 1,8 milhões de barris/dia em 2008 para cerca de 1,1 milhões em 2024 —
exige uma reorientação estratégica. Angola pode apoiar a Namíbia, que desponta
como nova fronteira petrolífera, com know-how, logística e formação de quadros
técnicos, beneficiando ambas as nações com partilha de infraestrutura e
receitas cruzadas.
* *Mineração:* A África do Sul é referência mundial em mineração. Angola,
com vastas reservas por explorar (diamantes, ouro, terras raras), pode atrair
operadores sul-africanos, com transferência de competências, acesso a mercados
e criação de joint ventures tecnológicas.
* *Agroindústria e Carne Bovina:* Botswana, Namíbia e África do Sul já exportam carne de qualidade para a União Europeia, respeitando normas sanitárias rigorosas. Angola pode aprender com esses modelos, investir em certificação veterinária, cadeias de frio e melhoria genética animal, criando uma nova frente de exportação e reduzindo a dependência de importações alimentares.
*IV. Condições Necessárias para o Sucesso*
Para que este cenário se concretize, são imprescindíveis:
1. *Governança transparente e estabilidade institucional;*
2. *Ambiente regulatório favorável ao investimento privado;*
3. *Formação e capacitação técnica da juventude africana;*
4. *Integração digital e desburocratização dos processos fronteiriços;*
5. *Combate efetivo à corrupção e promoção da justiça económica.*
*Conclusão: Uma Visão Unificada e Estratégica*
A África Austral, se bem coordenada, pode transformar-se num *pilar
continental de crescimento sustentável e de influência diplomática global*. A
união dos seus povos, a integração das suas economias e o fortalecimento das
suas instituições serão as chaves para essa transformação.
Ao promover um marketing estratégico da região — destacando estabilidade,
oportunidade e diversidade — os países da África Austral podem atrair
investimentos, aumentar o comércio intra-africano e erguer uma nova era de
desenvolvimento africano sob *liderança africana*, com prudência.
0 Comentários