O representante do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Antero de Pina, afirmou que, nos últimos anos, a organização observou avanços significativos na área da Saúde Infantil e Materna em Angola. Na entrevista ao Jornal de Angola, destaca, entre os avanços mais recentes, a redução expressiva da taxa de mortalidade de crianças menores de cinco anos, que passou de mais de 203 por mil nascidos vivos, em 2000, para cerca de 67 por mil, em 2022
Redacção
Como o UNICEF tem
contribuído para a promoção da saúde infantil e materna no contexto da
Cobertura Universal de Saúde em Angola?
O UNICEF tem desempenhado um papel crucial na promoção da
saúde infantil e nutrição em Angola, alinhando-se aos objectivos da Cobertura
Universal de Saúde (CUS). Trabalhamos em estreita colaboração com o Governo
para desenvolver Políticas e Planos de implementação, que promovem uma
abordagem integrada, holística dos problemas de saúde e centrada nas
necessidades das famílias. Além disso, apoiamos o aumento da procura e
utilização das vacinas de rotina, com foco na redução do número de crianças
zero dose (crianças que nunca tomaram nenhuma vacina), por meio de mobilização
social e fortalecimento do sistema de imunização, contribuindo, também, para a
erradicação da poliomielite. Paralelamente, promovemos o aleitamento materno
exclusivo e o acesso a serviços de nutrição para as crianças, capacitando
profissionais de Saúde e sensibilizando mães sobre práticas essenciais para o
crescimento saudável das crianças.
O UNICEF tem o foco em duas frentes principais: advocacia
contínua e apoio directo ao Governo para materializar os compromissos
assumidos. Na área da advocacia, o UNICEF utiliza todas as oportunidades para
reforçar a liderança do Ministério da Saúde na implementação dos oito
compromissos da Declaração, além de apoiar a avaliação contínua do progresso em
relação aos indicadores de desempenho. Por meio de análises regulares de dados,
identificámos províncias que precisam acelerar as suas açcões, organizando encontros
anuais para discutir avanços, desafios e definir estratégias de melhoria.
Ciente da necessidade de priorização de recursos financeiros, realizámos
análises do Orçamento Geral do Estado e da despesa pública em saúde,
identificando áreas que precisam de maior atenção.
Que ilações tiraram
dessas análises?
Reconhecendo as limitações fiscais impostas pelo contexto
macroeconómico, actual, apoiamos o Governo no acesso a recursos adicionais,
como o mecanismo de Matching Fund, que duplica os investimentos em nutrição, ao
fornecer produtos equivalentes aos adquiridos com recursos do orçamento
nacional. Isso amplia o alcance das crianças tratadas. Além disso, o UNICEF
apoia a aquisição de vacinas a custos mais competitivos, promovendo maior
eficiência no uso dos recursos disponibilizados pelo Estado angolano. Dessa
forma, contribuímos para fortalecer o Sistema de Saúde e garantir que os
compromissos da Declaração de Luanda avancem em direcção à Cobertura Universal
de Saúde.
Como o UNICEF
trabalha para garantir que crianças e adolescentes tenham acesso a cuidados
primários de saúde?
Uma das principais iniciativas é o apoio ao fortalecimento
dos cuidados neonatais, incluindo o estabelecimento de centros de simulação,
que estão em curso na província da Huíla, para proporcionar treinamento prático
aos profissionais de Saúde no manejo de recém-nascidos em situações críticas.
Além disso, promovemos a implementação da iniciativa “Hospital Amigo da
Criança”, que incentiva boas práticas de cuidado materno-infantil, como o
aleitamento materno. Para enfrentar os desafios de Saúde Infantil, o UNICEF
capacita profissionais em abordagens integradas, como a Gestão Integrada de
Doenças da Infância e a Gestão Integrada de Desnutrição Aguda. Por meio dessas
acções, o UNICEF não contribui apenas para a melhoria da qualidade dos Serviços
de Saúde, mas também assegura que esses esforços sejam baseados em evidências e
adaptados às necessidades das comunidades, promovendo um impacto sustentável na
saúde infantil e dos adolescentes.
Quais são os principais
desafios que o UNICEF enfrenta ao promover a saúde universal infantil em
Angola?
Os principais desafios estão directamente ligados às
limitações do acesso aos serviços de saúde e alocação de recursos. Em muitas
comunidades, as unidades sanitárias de nível primário ainda são insuficientes e
os existentes frequentemente carecem de uma oferta completa de serviços
essenciais, como atendimento pré-natal, parto, vacinação e puercultura para
crianças saudáveis de até cinco anos, fundamentais para prevenir o surgimento
de doenças. Outro grande desafio é a necessidade de fortalecer a saúde
comunitária, para que esta seja integrada de forma efectiva à atenção primária
e esteja disponível cobrindo as áreas de promoção da saúde, prevenção de
doenças, tratamento e reabilitação.
Qual é o papel da saúde
comunitária?
A saúde comunitária desempenha um papel crucial na ampliação
do acesso aos cuidados de saúde, especialmente em áreas remotas, permitindo a
prevenção de ocorrência de doenças, identificação precoce de problemas de saúde
e a ligação das famílias aos serviços disponíveis nas unidades sanitárias.
Diante desses desafios, o UNICEF continuará a trabalhar com o Governo de
Angola, por meio do Ministério da Saúde, para acelerar os investimentos nessas
áreas prioritárias, assegurando que mais unidades sanitárias sejam
estabelecidas e que todas ofereçam um pacote abrangente de serviços essenciais.
Além disso, reforçaremos o apelo para que a saúde comunitária receba o apoio
necessário, contribuindo para a realização da Cobertura Universal de Saúde no
país.
A desnutrição
representa, também, um grande desafio?
Sim. É outro desafio que deve merecer atenção. O Relatório
sobre o Estado da Nutrição e da Segurança Alimentar no Mundo em 2023 dá conta
que a taxa de desnutrição aguda grave em Angola é de 38%.
O UNICEF apoia o Governo de Angola na redução da mortalidade
por desnutrição, e isso envolve a promoção de práticas alimentares adequadas, a
melhoria do acesso a serviços de nutrição e a identificação precoce de crianças
em risco de desnutrição.
Que avanços o UNICEF
observou recentemente na área da Saúde Infantil e Materna em Angola?
Nos últimos anos, o UNICEF observou avanços significativos na
área da Saúde Infantil e Materna em Angola. Dentre os avanços mais recentes,
podemos destacar a redução da taxa de mortalidade de crianças menores de 5
anos, de mais de 203/1000 em 2000, para cerca de 67/1000 em 2022. O Ministério
da Saúde tem demonstrado um compromisso crescente em priorizar a aquisição de
vacinas e produtos de nutrição, embora ainda haja muito a ser feito para
alcançar níveis ideais de financiamento, comparando com os padrões recomendados
pelos organismos internacionais. Esses esforços têm contribuído para melhorias
graduais nos indicadores de saúde. Como resultado, há uma redução progressiva
na mortalidade materna e infantil, reflectindo o impacto de um maior acesso às
vacinas e ao tratamento de condições nutricionais críticas. Esses avanços são encorajadores
e reforçam a importância de continuar a investir na saúde para alcançar a
Cobertura Universal de Saúde e proteger as vidas das mães e crianças angolanas.
Como o UNICEF aborda o
impacto financeiro da saúde nas famílias angolanas, especialmente as mais
vulneráveis?
O UNICEF entende que os custos associados ao acesso à saúde
podem ser uma barreira significativa para muitas famílias angolanas,
especialmente às mais vulneráveis. Para mitigar esse impacto financeiro,
trabalhamos em estreita colaboração com o Ministério da Saúde, para o
fortalecimento dos cuidados de saúde primários, especialmente nas comunidades
mais remotas, reduzindo a necessidade de deslocamentos dispendiosos para ter
acesso a serviços de saúde. Além disso, apoiamos iniciativas como a alocação
eficiente de recursos públicos na saúde, para que serviços como vacinação e
nutrição sejam amplamente disponibilizados sem custos directos para as
famílias.
Como o UNICEF vê o
papel do Governo em garantir a saúde das crianças e adolescentes do país?
O Ministério da Saúde desempenha um papel central na
formulação de políticas, alocação de recursos e fortalecimento do Sistema de
Saúde, assegurando que serviços essenciais, como consulta pré-natal, cuidados
neonatais, vacinação, prevenção e tratamento da desnutrição e doenças comuns
como a malária, doenças diarreicas e respiratórias sejam acessíveis e de
qualidade.
A liderança do Governo é essencial para expandir a cobertura
dos cuidados de saúde primários, integrar a saúde comunitária e investir na
infraestrutura das unidades sanitárias, especialmente em áreas de maior
vulnerabilidade. Além disso, é responsabilidade do Estado continuar a priorizar
a saúde no Orçamento Geral do Estado e implementar mecanismos que garantam a
equidade no acesso aos serviços.
No entanto, o UNICEF também reforça que a saúde é um esforço
colectivo. Comunidades, famílias, parceiros internacionais e organizações da
sociedade civil desempenham papéis complementares no apoio às políticas e
programas do Governo. O UNICEF está comprometido em colaborar com o Governo e
outros actores para alcançar a Cobertura Universal de Saúde, assegurando que
todas as crianças e adolescentes tenham a oportunidade de crescer saudáveis e
realizar o seu pleno potencial.
Que tipo de parcerias o
UNICEF acredita serem essenciais para alcançar a saúde universal para as
crianças?
Alcançar a saúde universal para as crianças exige parcerias
sólidas diversificadas, que reúnam esforços do Governo, organizações
internacionais, sector Privado, sociedade civil e comunidades locais. Cada
parceiro desempenha um papel único e complementar nesse processo.
1. O Governo: O Ministério da Saúde é essencial para
fortalecer o Sistema de Saúde, priorizar recursos no Orçamento Geral do Estado
que sejam sensíveis às necessidades das crianças e implementar políticas
públicas que garantam o acesso universal aos cuidados de saúde primários 2.
Organismos Internacionais e Agências da ONU: Parcerias com organizações
multilaterais como a OMS, Gavi e o Fundo Global, ajudam a mobilizar recursos
financeiros, técnicos e logísticos para ampliar o acesso aos serviços
essenciais, incluindo medicamentos.
3. Sector Privado: O envolvimento do sector Privado é crucial
para fornecer soluções inovadoras, como tecnologias para fortalecer os Sistemas
de Saúde e para contribuir com financiamentos, incluindo parcerias
público-privadas que aumentem o impacto dos investimentos em saúde.
Qual é o papel da Sociedade
Civil e das ONG?
Essas parcerias são fundamentais para promover a mobilização
social, sensibilizar as comunidades sobre a importância da saúde preventiva e
assegurar que as intervenções alcancem os grupos mais vulneráveis. Para além
disso, o envolvimento activo de comunidades de forma organizada e participativa
é indispensável para a sustentabilidade das acções de saúde. Elas desempenham
um papel central na adopção de práticas saudáveis e no fortalecimento da
procura por serviços de saúde.
Quais são os próximos
passos do UNICEF para assegurar a saúde universal de crianças e mães em Angola?
Os próximos passos do UNICEF concentram-se no fortalecimento
do sistema de Saúde e na resposta às necessidades prioritárias. Isso inclui a
promoção e adaptação de políticas favoráveis, apoiando o Governo na formulação
e implementação de estratégias que garantam a equidade no acesso aos serviços
de saúde, especialmente para as populações mais vulneráveis. O apoio ao
Ministério da Saúde na quantificação e aquisição eficiente de vacinas e insumos
de nutrição será intensificado, garantindo estoques que atendam à procura de
forma sustentável. Paralelamente, o UNICEF colaborará na introdução de novas
vacinas, como a vacina contra o cancro do colo do útero e da malária,
fortalecendo a protecção contra doenças evitáveis, e na expansão e modernização
do sistema de acondicionamento da vacina, essencial para a conservação das
vacinas e a ampliação da cobertura vacinal.
Que metas o UNICEF
estabeleceu para melhorar a Saúde Infantil no âmbito da CUS em Angola?
O UNICEF estabeleceu várias metas no âmbito do seu programa
de apoio ao país 2024/2028, que contribuirão para o alcance da Cobertura
Universal de Saúde (CUS) em Angola, com o objectivo de melhorar a Saúde Infantil
em estreita colaboração com o Governo e outros parceiros. Essas metas incluem
advocacia para investimento nos cuidados de saúde primários no primeiro nível
de atenção sanitária o mais próximo das comunidades. A redução do número de
crianças zero dose, apoiando o Governo em campanhas de vacinação de rotina e
acções direccionadas às áreas de difícil acesso, com o objectivo de aumentar a
cobertura vacinal e garantir que todas as crianças recebam as vacinas
essenciais para a prevenção de doenças evitáveis. Além disso, o UNICEF
contribui para melhorar a qualidade do processo de vacinação, incluindo a
capacitação de profissionais de Saúde, a garantia da cadeia de frio para
preservar as vacinas e a realização de campanhas de sensibilização para
aumentar a aceitação da vacinação.
Qual tem sido o
contributo do UNICEF na erradicação da poliomielite e a redução dos casos de
sarampo?
Na erradicação da poliomielite e a redução dos casos de
sarampo, o UNICEF apoia o Governo com recursos técnicos e financeiros para
campanhas de imunização em massa, além de reforçar a resposta a surtos dessas
doenças. O UNICEF, também, apoia as reformas no programa de saúde comunitária,
com o intuito de torná-lo mais eficaz e integrado ao sistema de saúde, para que
a saúde comunitária possa contribuir significativamente para o alcance dos
Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, garantindo que os serviços de saúde
cheguem às populações mais vulneráveis.
O UNICEF está, igualmente, comprometido em reduzir as mortes
neonatais evitáveis, apoiando a melhoria da qualidade do atendimento a
recém-nascidos, através da formação de profissionais de Saúde, da melhoria da
infraestrutura e do fortalecimento dos cuidados neonatais. Por fim, o UNICEF
trabalha para estabelecer abordagens multissectoriais que integrem acções de
saúde, nutrição e segurança alimentar, com o objectivo de combater a
desnutrição crónica infantil e garantir que as crianças tenham acesso a uma
alimentação adequada e aos cuidados necessários para o seu crescimento
saudável.
Em que aspectos da
Saúde Infantil e Materna o UNICEF espera ver melhorias a curto prazo?
Na redução da morbidade e mortalidade por doenças
transmissíveis e na diminuição da mortalidade por desnutrição aguda. A redução
da morbidade e mortalidade por doenças transmissíveis, a malária, doenças
diarreicas, sarampo e doenças respiratórias, é uma prioridade. Além disso, o
UNICEF foca na redução da mortalidade por desnutrição aguda. Isso envolve a
promoção de práticas alimentares adequadas, a melhoria do acesso a serviços de
nutrição e a identificação precoce de crianças em risco de desnutrição.
Quais são os resultados
alcançados?
Por exemplo, em 2024, em sete províncias apoiadas pelo
UNICEF, cerca de 950,000 crianças menores de 5 anos foram rastreadas para a
Desnutrição Aguda e Severa das quais 60.000 foram encaminhadas para tratamento.
Mais de 90 por cento das crianças curadas e salvas. Esses resultados, ao serem
escalados, são essenciais para melhorias imediatas no estado de saúde infantil
e materna em Angola e o alcance das metas do Plano de Desenvolvimento Nacional.
Que mensagem
gostaria de transmitir às famílias e à sociedade angolana sobre a importância
da saúde universal?
A saúde universal é um direito fundamental para todas as
crianças e mães conforme vem na Constituição da República, e é essencial para
garantir um futuro mais saudável e próspero para todos. A saúde universal
significa que todos, independentemente da sua localização, condição
socioeconómica ou origem, devem ter acesso a serviços de saúde de qualidade,
que atendam às suas necessidades de maneira equitativa e sem sofrer barreiras
financeiras.
Para as famílias, a mensagem é clara: a vacinação, a nutrição
adequada, os cuidados pré-natais e a promoção de práticas saudáveis são
essenciais para garantir a saúde e o bem-estar das crianças e das mães. Essas
acções são fundamentais, não apenas para prevenir doenças, mas, também, para
assegurar que as crianças possam crescer de forma saudável, com oportunidades
iguais para um futuro melhor.
O UNICEF deseja reforçar que a saúde não é responsabilidade
apenas do Governo, mas de todos, sobretudo no que concerne à prevenção de
doenças e adopção de hábitos de vida saudáveis. Cada membro da comunidade tem
um papel importante a desempenhar, seja promovendo a vacinação, apoiando a
nutrição, praticando hábitos de vida saudáveis ou incentivando o uso de
serviços de saúde. A união de esforços entre o Governo, as comunidades, as
famílias e os parceiros é essencial para alcançar a saúde universal e garantir
que nenhuma criança ou mãe seja deixada para trás. O UNICEF faz um apelo para
que as famílias se envolvam activamente na promoção da saúde, aproveitando os
serviços de rotina disponíveis e apoiando as campanhas de saúde, garantindo que
todos, sem excepção, possam desfrutar de uma vida saudável e alcançar o seu
pleno potencial.
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